Uma das análises mais interessantes para desmistificar o sucesso de Harry Potter está no sentimento que a obra desperta: o desejo humano de simplesmente fazer os problemas desaparecerem. Temos o arquétipo do órfão, que acredita ter perdido os pais em um acidente, como contaram seus tios, sendo maltratado pelos únicos parentes vivos e vivendo em um armário embaixo da escada, na agora lendária Rua dos Alfeneiros, número 4.
A ideia de escapar de uma realidade cinzenta para descobrir um mundo completamente novo, mágico e repleto de possibilidades é, por si só, profundamente cativante. E foi justamente esse sentimento que alimentou, durante anos, a expectativa pelo lançamento de Hogwarts Legacy: a chance de finalmente viver como um estudante da maior escola de bruxaria da Inglaterra. Aprender feitiços, ir mal em Poções, montar sua própria história e apontar a varinha para um objeto dizendo: “Não é leviosa, é LEVIOSÁ!”, era um sonho alimentado por gerações que cresceram com os livros.
No entanto, quando o jogo finalmente chegou, a experiência teve seus altos e baixos. Lançado primeiro para PC, Xbox Series e PS5, depois para PS4 e Xbox One, e só mais tarde, em um claro clima de “fim de festa” no Nintendo Switch, a empolgação deu lugar à frustração. Ainda que a Avalanche Software mereça elogios pela ousadia de adaptar o game ao hardware do Switch original, era inegável que o console simplesmente não tinha potência para sustentar aquela visão mágica. O resultado foi uma experiência limitada, tecnicamente instável e visualmente comprometida.
Foi talvez por isso que muitos receberam com ceticismo o anúncio da nova versão para o Nintendo Switch 2, feito durante a Direct de abril. Seria apenas um polimento gráfico? Um relançamento com cara nova? Mais uma tentativa da Warner Bros. de arrancar nosso suado ouro dos bolsos? Dois meses depois, essas dúvidas começam a se dissipar.

Uma nova história (finalmente)
Sim, amamos Harry Potter. Sim, amamos esse universo. Mas é verdade que o público ansiava por histórias inéditas — algo que nem os filmes de Animais Fantásticos, nem a peça A Criança Amaldiçoada conseguiram entregar com consistência. Foi nesse vácuo narrativo que Hogwarts Legacy brilhou com potencial: ao trazer uma trama nova, ambientada no fim do século XIX, cerca de 100 anos antes dos eventos do “menino que sobreviveu”.
Aqui, controlamos um(a) jovem que ingressa diretamente no quinto ano de Hogwarts (sim, do nada mesmo!) e se vê envolvido(a) em uma ameaça mágica oculta. Ao lado do excêntrico professor Fig (que, sejamos francos, tem sérios problemas em priorizar a segurança dos alunos), descobrimos uma habilidade rara: a capacidade de ver e manipular vestígios de uma magia ancestral esquecida.
Sem dar spoilers, é importante pontuar: a trama principal, embora curiosa, por vezes se arrasta e falha em gerar a empatia esperada. Por outro lado, o brilho do jogo está nas missões secundárias, que entregam narrativas bem mais envolventes e emocionantes. A história de Sebastian Sallow, aluno da Sonserina, por exemplo, é tão impactante que chega a ofuscar o enredo principal. São essas pequenas tramas que tornam o mundo do jogo mais rico, familiar e cheio de referências ao universo que já conhecemos.

Jogabilidade encantadora — agora, de verdade
Vamos ao ponto mais aguardado: como está Hogwarts Legacy no Nintendo Switch 2?
A resposta é direta: está maravilhoso.
A jogabilidade flui de maneira estável, sem engasgos perceptíveis, tanto no modo portátil quanto no dock. Em combates com vários inimigos simultaneamente, não há queda de desempenho aparente. A movimentação estável, a resposta dos feitiços e o tempo de carregamento tornaram-se aliados da imersão. Jogar agora é realmente prazeroso.
Sim, há pequenos bugs — como inimigos encravados em paredes ou falhas na mira — mas são pontuais, e presentes também em outras plataformas. Nada que comprometa a experiência geral.
Aqui, um parêntese pessoal: joguei Hogwarts Legacy no Switch original, no PS4 e no Xbox One. E afirmo com convicção — a versão do Switch 2 é superior a todas elas. A fluidez muda completamente o ritmo da aventura e transforma a forma como você vive o mundo bruxo. É como se a Avalanche finalmente tivesse entregado o jogo que sempre sonhou — e que os fãs da Nintendo, há muito tempo, mereciam.
Outro destaque é o modo com mouse, que deu uma nova cara à forma de jogar. Apesar de ter causado certa estranheza inicialmente, ele amplia as opções de jogabilidade de maneira positiva. Aliás, está muito bem ajustado no Switch , em muitos momentos, funcionou até melhor que o controle tradicional durante a experiência.
As transições de tela, que também haviam sido prometidas como otimizadas, realmente impressionam. A saída do castelo para os campos, por exemplo, acontece de forma tão rápida que mal dá tempo de pensar em qualquer tipo de loading. A sensação de fluidez é constante e isso faz toda a diferença em um jogo de mundo aberto.
E voar com a vassoura? O que parecia ser um desafio técnico que derrubaria os frames, na verdade, se tornou um dos pontos altos da experiência. Como é gostoso planar pelos céus dos campos de Hogwarts com desempenho estável e visual encantador! É um verdadeiro sonho bruxo realizado.
Visual caprichado e atmosfera preservada
Se o desempenho surpreende, o visual acompanha. Embora não rivalize com um PS5 ou um PC de ponta, o Switch 2 mostra que tem poder suficiente para entregar uma experiência imersiva. Texturas mais nítidas, iluminação convincente nos corredores de Hogwarts, efeitos climáticos funcionais e uma atmosfera cuidadosamente mantida fazem o mundo parecer vivo.
Este redator, que ostenta no braço uma tatuagem do Mapa do Maroto e não esconde o fanatismo, se pegou diversas vezes parando para admirar a paisagem. Não é apenas sobre caminhar pelos corredores de Hogwarts — é sobre explorar toda a região ao redor: a Floresta Proibida (proibida por quem, mesmo?), vilarejos como Hogsmeade, e vastos campos que se estendem por todos os lados. Quando você finalmente desbloqueia o voo com a vassoura, a sensação de liberdade é indescritível.
E tudo isso é embalado por uma trilha sonora que toca o coração. As composições evocam imediatamente a atmosfera encantada dos filmes e livros, criando um elo afetivo com os fãs mais antigos. Até mesmo ações simples, como coletar uma página flutuante, ganham peso emocional ao serem acompanhadas por variações da icônica melodia de Harry Potter. Cada acorde é cuidadosamente inserido, reforçando a sensação de estar vivendo uma verdadeira fábula mágica dentro de Hogwarts.

“Mas eu nunca li Harry Potter, posso jogar?“
Claro que pode! Embora o game esteja repleto de referências (como a presença de uma Weasley como diretora da Grifinória) ele não exige nenhum conhecimento prévio da saga. Hogwarts Legacy é perfeitamente acessível a quem nunca leu os livros ou assistiu aos filmes. A narrativa é independente e oferece ao jogador liberdade para definir o tipo de bruxo que deseja ser. Ainda assim, quem conhece a saga certamente notará detalhes que enriquecem a experiência.
A variedade de missões é extensa, a ponto de, em alguns momentos, deixar o jogador um pouco perdido. Há tanta coisa para fazer que é fácil sentir uma leve exaustão ou dificuldade em manter o foco na trama principal.
Um ponto que merece crítica é o sistema de customização. Embora existam muitos itens cosméticos espalhados pelo mapa, a variedade real pode parecer frustrante, já que muitos deles se repetem. “Ora, é só vender depois”, diria alguém. Mas aí entra outro problema: o limite do inventário é bastante restrito, a menos que você realize as chamadas Missões de Merlin, o que acaba tornando essa atividade praticamente obrigatória. Essa sensação de “obrigatoriedade disfarçada” pode ser incômoda para parte do público.
Outro elemento importante é o sistema de talentos, que funciona como uma árvore de habilidades no estilo RPG. A cada nível, o jogador ganha um ponto para investir em áreas como magias ofensivas, defesa, furtividade e até mesmo nas artes das trevas. Embora interessante, o sistema carece de profundidade. Falta uma camada moral mais impactante ou decisões que realmente alterem a experiência narrativa, o que pode desapontar jogadores mais exigentes nesse quesito
Um mundo aberto à altura da magia
Hogwarts Legacy é, de fato, um jogo grande. Muito grande. E não apenas em termos de conteúdo, mas no legado (com o perdão do trocadilho) que carrega: o peso de se inserir em um dos universos mais ricos e influentes da cultura pop. Tudo isso em meio ao desafio extra de navegar pelas polêmicas causadas por sua criadora, cujas falas muitas vezes contrariam os próprios valores de empatia e respeito que a obra deveria inspirar.
Ainda assim, Hogwarts Legacy é um jogo onde a palavra esplendor se encaixa perfeitamente. É magnânimo e épico a cada transição. Por mais que deixe no ar aquela sensação de que poderia ousar um pouco mais — dar mais liberdade, aprofundar decisões morais, o game acerta em cheio ao criar sua própria identidade dentro da franquia. As batalhas, aliás, são um dos grandes destaques: há algo profundamente emocionante em conjurar Expelliarmus, Confringo e tantos outros feitiços que muitos de nós conhecemos desde a infância.
É com imensa alegria que podemos afirmar: essa experiência mágica agora existe de forma mais que satisfatória no Nintendo Switch 2. Trata-se de um presente para os fãs da Big N, que enfim recebem uma versão à altura daquilo que sempre imaginaram ao sonhar com uma vida em Hogwarts.
A nota um pouco agridoce fica por conta do preço de lançamento, elevado, considerando que o hype do jogo já passou para muitos. Ainda assim, promoções devem surgir, como já vimos na pré-venda, que oferecia o título por R$ 139 — um valor muito mais justo pelo que é entregue.
Vale a pena jogar Hogwarts Legacy no Switch 2?
Concluo essa análise com uma adaptação da frase de meus queridos Marotos: Pontas, Almofadinhas, Rabicho e Almofadinha :
Bem feito, feito.
Hogwarts Legacy arrives on the Nintendo Switch 2 with the grandeur it always deserved. After a frustrating initial release on the previous console, Big N fans finally receive a smooth, visually polished, and technically stable experience — something essential for the magic to truly work.
Despite some stumbles in the main narrative and limitations in the progression and customization systems, the game shines where it matters most: in atmosphere, combat, and immersion. Exploring the halls of Hogwarts, flying across the open fields on a broomstick, and casting classic spells is everything a fan could wish for — and more.
With improved performance and the quality delivered, Hogwarts Legacy stands as one of the best third-party adaptations on the Switch 2 so far.
If you ever dreamed of receiving your Hogwarts letter…
Now is the time to open the envelope.
Nota do Editor: Hogwarts Legacy Nintendo Switch 2 Edition foi analisado no Nintendo Switch 2. A cópia do jogo foi gentilmente cedida pela Warner Bros. Games para avaliação.]
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