“Como até hoje ninguém lançou um jogo assim?”. Essa é a pergunta que Formula Legendsprovoca no pensamento de quem o abre pela primeira vez. Afinal, não tem como dar errado: um jogo de corrida com gameplay e mecânicas consistentes, mesclando elementos arcade com simulação e gráficos que vão mais para o cartoon do que para o realismo. É uma excelente pedida, que claramente poderia receber a licença oficial da categoria Formula 1, e que inclusive tem potencial para abrir essa porta, a exemplo do que o iRacing está fazendo ao anunciar uma versão exatamente assim para o simulador mais popular existente no mercado.
Se a introdução parece confusa, aqui vai a mensagem de forma mais clara: Formula Legends “quebra” o realismo dos jogos oficiais da Fórmula 1 e entrega algo que, há que se considerar, vale muito mais: diversão. O jogo passa por diferentes décadas e apresenta diversos carros, pilotos e circuitos. É desafiador, mas também recompensador, como uma boa corrida deve ser. E tudo isso, vale mencionar, é indie, desenvolvido por um time da Itália, com aproximadamente 50 pessoas: a 3D Clouds, criada em 2016 e que tem outros jogos de corrida no currículo, mas é conhecida por trabalhar com grandes IPs, como Patrulha Canina, Hotwheels, Velozes & Furiosos e Transformers.
Nota do autor: o DNA italiano pode ser sido justamente o que Formula Legends precisava. Todo mundo sabe que os italianos são apaixonados por velocidade, e isso fica claro ao jogar.
O Project N já havia analisado positivamente a demo – que segue disponível para download gratuito na eShop – e o produto final não apenas confirma o potencial como mostra que os horizontes foram expandidos. O modo “história” (sim, uma carreira!) tem muitas horas de diversão e é a chave para o desbloqueio de conteúdos como novos carros, pilotos e pistas; o “contra o tempo” é amplo e estimula o replay para encontrar a volta perfeita; e o campeonato personalizado representa múltiplas possibilidades.
A personalização vai além dos modos de jogo e se encontra também nas opções. Como dito inicialmente, Formula Legends apresenta elementos de arcade e de simulação, configurando um “simcade”. Isso quer dizer que o jogador pode deixar o “antitravamento de freios” ligado ou desligado, aumentar ou diminuir os danos provocados por colisões, decidir a porcentagem de incidência das regras do esporte, o consumo de combustível e até mesmo se o acionamento das asas traseiras (DRS na vida real, WRS aqui) é automático ou manual. E por aí vai.
É como dizem os desenvolvedores:
“Uma carta de amor à Fórmula, Formula Legends leva você em uma jornada pelos períodos mais icônicos do automobilismo. Das máquinas barulhentas dos anos 60 à tecnologia de ponta dos dias atuais, viva a evolução das corridas de monopostos em um mundo lindamente estilizado.”
Um jogos, muitos recursos disponíveis
Em Formula Legends os pneus se desgastam e é necessário trocá-los – sendo que as categorias mais antigas contam com duas opções (duros e para piso molhado) e as mais atuais contam com quatro (macios, médios, duros e para piso molhado). Então o gerenciamento de pneus está presente.
O jogo também conta com sistema de combustível, com tanque que vai esvaziando a cada volta. Ou seja, o gerenciamento de combustível está presente.
E ainda há a aplicação de regras reais da Fórmula 1, como punições de tempo para quem sai do traçado mais do que três vezes. O que quer dizer que as regras esportivas estão presentes, contando inclusive com sistema WRS que é equivalente ao DRS da vida real e também com uso de bateria recarregada com a força da frenagem nos carros mais recentes.
Mas há algo a mais. Normalmente em jogos de corrida deste gênero o sistema de colisões apresenta uma ícone do carro, que vai de verde (bom estado) à vermelho (quebrado), com dano variável em peças como asas dianteiras e traseiras, suspensão, eixo, etc. Aqui não. Isso está presente, é evidente, porém de outra forma: com uma barra de vida.
Além de gerenciar o combustível é preciso cuidar da “saúde” do carro. A cada pancada contra o muro e a cada toque nos adversários essa barrinha vai diminuindo. E assim como o desgaste de pneus, quando ela fica muito baixa, afeta o funcionamento do carro.
Vale destaque para o fato de que é um dos poucos jogos da categoria que apresenta dois pilotos por equipe. Em pista são 14 pilotos e 7 equipes, o que confere mais realismo ao game.
É claro que já estão implementados inúmeros recursos. Mesmo assim, seria muito bacana ter a opção completa para a classificação – com Q1, Q2 e Q3 –; ou uma menção/identificação mais clara ao piloto que fez a volta mais rápida na corrida; ou sistema de bandeiras amarelas, vermelhas, e safety car; ou então uma melhor comunicação via áudio com o engenheiro de corrida (que atualmente fala em um idioma não compreensível, apenas para conferir imersão). Isso além de outras coisas menores. E o que me deixa animado é que tudo isso pode ser inserido no futuro, já que a 3D Clouds parece comprometida com o projeto.
Mini game do pit stop
Cada jogo de Fórmula 1 apresenta uma mecânica própria para os pit stops. Alguns optam por fazer o jogador apenas assistir, enquanto outros, como Formula Legends, apostam em colocar a ação – e a responsabilidade por uma parada rápida – nas mãos do jogador, o que adiciona adrenalina.
Ao entrar no box, o jogador precisa apertar e segurar R para encher o tanque com combustível; apertar e segurar L para encher a “saúde” do carro; e apertar os botões de face (A, B, X, Y) na sequência que aparecer na tela. Ao final, é necessário também apertar os dois analógicos para liberar o carro.
O interessante é: erre a sequência de botões e terá um pit stop mais lento. E para quem joga ou já jogou, para além do Nintendo Switch em algum controle de Xbox ou PlayStation, é uma missão difícil, em razão da posição dos botões. Afinal, cada um destes videogames tem um X em uma posição diferente.
Aliás, outra coisa interessante é que Formula Legends conta com muitos desbloqueáveis, o que é excelente. Nada de DLCs pagos ou conteúdo freemium. Jogue – e jogue muito – para obter mais pontos no modo história, ou mais horas jogadas com a equipe X ou Y, e veja seu catálogo aumentar. Aliás, tem uma seção específica no menu para ver isso, o “Salão”. Aproveite.
A adrenalina das corridas
Para explicar o nível de imersão que Formula Legends proporciona, especialmente aos fãs mais apaixonados pelo esporte como eu, compartilho um relato pessoal. Quando comecei a jogar, fui no Modo História e selecionei o primeiro campeonato, dos anos 1960. Escolhi um carro/piloto e fui à pista, na Bélgica, inspirada em Spa-Francochamps. Nada, nem mesmo o uso de assistências, me fez completar a primeira a curva corretamente. Ao invés de ficar estressado, tentei novamente mais tarde, mas selecionei outra década, indo na ordem.
Foi somente quando eu escolhi os anos 1990 o jogo “clicou” pela primeira vez. Talvez pelo som dos motores, que são muito bem feitos e transmitem sensação de velocidade, com o tom correto inclusive quando se passa sobre as zebras, ou talvez pela velocidade um pouco mais alta e frenagem mais ágil. Ou, quem sabe, pelas pinturas e visual dos carros, que já é mais familiar a mim. Fato é que fui muito melhor, e me senti à vontade para passar da dificuldade “Fácil” para o “Normal”.
Mas tudo mudou mesmo quando eu optei pela década de 2010. Pilotar a Renault Pentault de Sainz Saez foi incrível. Era como se eu e o carro fossemos um só. Meus erros em pista foram diminuindo, e então o fator estratégia surgiu. Perdi o pódio de uma corrida porque não administrei bem os pneus. A pista começava a secar, mas ignorei este fato e acelerei. Meus compostos preparados para chuva não aguentaram, e na última volta, se desgastaram por completo. Fiquei em último.
Na próxima corrida consegui me classificar melhor, em quarto. E na corrida eu e a pista parecíamos um só. Ultrapassei os adversários e fiquei em primeiro. Na hora dos boxes, minha parada foi mais lenta, e uma Ferrari Ferenzo saiu à frente. Mas na segunda curva após o pit eu tomei meu lugar, para então abrir mais de cinco segundos de vantagem e vencer.
E na etapa seguinte, embora não tenha saído vencedor do GP do Carnaval, no Brasil, conquistei a pole position. A sensação de velocidade veio, e veio para ficar. A moral da história é: não queira vencer logo de cara. Sente no cockpit e aproveite a jornada, porque com persistência uma hora você vai voar.
Estética e som
Ao evitar o realismo nos visuais, Formula Legends se torna colorido, vibrante e estilizado, o que é muito bem-vindo (e também uma tendência no cenário de jogos indies de corrida), como o Project N já destacou nas análises de New Star GP, Super Woden GP II, NeoSprint e outros games.. Enquanto a versão demo apresentava gráficos borrados, o produto final é muito mais otimizado no Nintendo Switch, embora ainda fique devendo um pouco.
A sensação é que dava para fazer mais. Aos olhos do jogador, parece que ainda seria possível apresentar um pouco mais de definição no híbrido da Nintendo. Em outros consoles, por exemplo, os pneus são mais nítidos, o que deixa a degradação deles bem visual e literalmente fácil de se ver. E além disso existem coisas como o cenário renderizando ao fundo (não a pista, e sim os elementos que a compõem, como prédios, arquibancada e árvores), o que embora adicione certa camada de nostalgia, deixa a sensação de que poderia ser contornado. Às vezes a pista fica azul, e quando chove, a marca dos pneus some, ao invés de diminuir. O que eu quero dizer é: o Switch aguenta mais, então uma otimização provavelmente resolveria.
Já em relação à câmera, na minha experiência, a melhor visão de jogo foi aquela em que o carro pode ser visto por inteiro. Falta uma visão do cockpit, mas a visão da “câmera onboard” é muito boa também, só que como o game tem gráficos estilizados, os pilotos são “cabeçudos”, então o capacete fica bem maior do que na vida real, e isso pode incomodar parte do público.
E o som é um show à parte. Os roncos dos motores são fiéis aos que se ouve em corridas de verdade, e isso é uma regra para todas as décadas (a HUD também acompanha essa passagem do tempo, o que é muito imersivo e interessante).. A mixagem, porém, às vezes faz com que o som fique abafado e o carro fique quase inaudível.
Ainda no tema “som”, a trilha sonora é genérica. As faixas não são marcantes, mas escutá-las fica ao gosto do freguês. Eu prefiro jogar com a trilha desligada, o que não é uma exclusividade para Formula Legends. Faço isso com todos os jogos, e recomendo especialmente nesse, uma vez que o som dos motores é realmente bem feito.
Bom humor
Quem não quer competir com Ayrton Senna Byron Renna, Rubens Barrichelo Boris Rubichello e Max Verstappen Mark Peerstaleen? É isso mesmo: Formula Legends contorna o fato de não poder usar os nomes oficiais das equipes e pilotos com muito bom humor.
Em cada uma da década o jogador pode escolher entre 7 opções de equipes, como Ferenzo, Will Win e Whitehorn. Pegou as referências? Não vou listar todas porque parte da graça é descobri-las. Então baixe a demo e explore tudo, que tal?
Alta dificuldade
O material enviado pelos desenvolvedores até que avisou sobre a curva de aprendizado. Mas este que vos escreve a subestimou, em certa medida. Não faça o mesmo: encare a curva de aprendizado como ela deve ser vista: íngreme.
Acontece que, diferente da maioria dos jogos de corrida atuais, Formula Legends não conta com linhas-guia na pista, e muito menos com aquela linha que fica vermelha para indicar o ponto ideal de frenagem. Aqui é tudo muito mais “raiz” e remonta aos tempos de 32 bits do PlayStation ou 64 bits do Nintendo 64, ou seja, a “linha ideal” nada mais é do que a marca dos pneus na pista. Siga o traçado demarcado por quem correu ali anteriormente e vá mais rápido e desgaste menos os pneus. Simples assim, como na vida real.
Fazer isso, porém, não é tarefa fácil. O jogo não entrega nada de mão beijada ao jogador. Então mais uma vez, assim como na vida real, será necessário ler as placas que indicam a distância de 150 metros, 100m e 50m da curva, para então decidir o melhor momento para frear. E além disso, outro fator conta muito, que é a experiência prévia.
Formula Legends parece partir do pressuposto que o jogador mais do que gosta, ele conhece os princípios do automobilismo, como as tangências de curvas. E isso não é, nem de longe, ruim, mas sim uma característica que o torna único. O que eu quero dizer é: quem não acompanha provas reais ou então não está muito acostumado com jogos de corrida vai ter mais dificuldade do que quem o faz. Isso porque para quem está imerso neste universo, o “flow” é muito mais natural, e embora a ausência de recursos como flashbacks possam fazer falta, eles não são fundamentais. Basicamente, quem respira Fórmula 1 já sabe que a “Eau Rouge”, icônica curva de Spa-Francochamps, se faz se pé em baixo, ou que em Mônaco se dar bem na classificação é fundamental. Ou que no Brasil o “S” do Senna é desafiador. E assim sucessivamente.
Bugs
Infelizmente, Formula Legends no Nintendo Switch (esta review foi feita a partir de um Nintendo Switch Lite) apresenta bugs frequentes. Em respeito às inúmeras dificuldades de desenvolvimento e otimização, este autor não costuma pontuar isto de maneira contundente em jogos indies, porém neste caso os problemas por vezes impedem a jogatina.
Em determinadas pistas e campeonatos, o jogo parece, de maneira aleatória, colocar uma parede invisível no meio do traçado, e o carro bate “sozinho”; em outras, o carro “afunda” no chão e fica travado. E reiniciar o jogo ou o campeonato não resolve, o que gera frustração.
Outra situação frequente é que o sistema que identifica a evolução do piloto na pista (setor marcado como roxo para melhor tempo geral, setor marcado como verde para melhora do tempo individual e setor marcado como amarelo para piora do tempo individual) nem sempre funciona. O tempo sempre é registrado, mas às vezes não as cores, o que prejudica o acompanhamento das voltas.
Tem ainda a pista ficando azul e outras questões menores. No entanto, não vou me alongar sobre estes temas, já que os desenvolvedores prometeram, via Discord oficial da 3D Clouds, a aplicação de um patch no Nintendo Switch, a exemplo do que foi feito em outras plataformas, o que deve acontecer em breve. Além de melhorias de forma geral, a atualização deve melhorar a IA dos adversários, reduzindo agressividade e implementando melhorias no sistema de colisão, e também oferecendo um novo sistema opcional de direção.
Custo x Benefício
Quando do lançamento, Formula Legends custava R$ 124,00 no Brasil, em todas as plataformas. Agora, na data da publicação desta review, o preço foi ajustado para nosso mercado, e está fixado em R$ 59,00 na eshop brasileira. O conteúdo é mais do que suficiente para justificar a compra, e a desenvolvedora está de parabéns por localizar o valor à moeda corrente. E não é só isso: o idioma também está localizado, estando 100% em português brasileiro. Que mais empresas façam isso e entreguem experiências de qualidade com preços que cabem no bolso!
Nota do autor: Venho analisando toda a biblioteca de jogos de corrida (principalmente os que envolvem Fórmula 1) disponíveis no Nintendo Switch. Ao lado de New Star GP, Formula Legends é um dos melhores. Sem dúvidas está no topo. São muitos os recursos disponíveis, como variação de clima (fique de olho nisso, aliás. Se o box te avisar da mudança de clima, já vá pensando na estratégia, porque influencia mesmo), bandeira azul (exibida quando você é ultrapassado por alguém que está uma ou mais voltas à frente ou vai ultrapassar carros que estão uma ou mais voltas atrás), desgaste de pneus, modo história e muito mais. Se o público achar interessante, pode ser legal uma coluna para comparar as experiências. Que tal?
Formula Legends
Veredito
Simples assim: Formula Legends é indispensável aos fãs de Formula 1, que no Nintendo Switch podem se sentir “esquecidos” pelos jogos oficiais de corrida da categoria. Embora tenha dificuldade que pode ser considerada como amarga para alguns, o game é bom em tudo o que se propõe a fazer, e ele propõe muito. Pilote carros dos anos 1960, 1970, 1980, 1990, 2000, 2010 e 2020 em um modo história robusto ou então em modos personalizados. Escolha diferentes versões para 14 circuitos e treine até se tornar o mais rápido neste game que mescla elementos arcade com simulação. Os visuais são bacanas, os desbloqueáveis são variados, a sensação de velocidade é alta, o fator replay também e o preço cabe no bolso. Falta apenas um pequeno toque de otimização, o que os desenvolvedores devem fazer no futuro. Uma das melhores experiências de automobilismo disponíveis no Nintendo Switch.
Design
100
Trilha Sonora
50
Diversão
100
Gameplay
100
Custo x Benefício
100
Prós
Muito conteúdo disponível, com carros e pilotos dos anos 1960, 1970, 1980, 1990, 2000, 2010 e 2020
Diferentes versões para cada um dos 14 circuitos
Modo história que permite jogar muitas temporadas diferentes
100% em português brasileiro
Contras
Alta dificuldade
Falta de otimização gráfica
Presença de bugs que podem impedir o gameplay
90
Nota Final
Gostou dessa review? Acesse também nossas outras análises
[Nota do Editor: Formula Legends foi analisado a partir da sua versão para Nintendo Switch. A cópia do jogo foi gentilmente cedida pela 3D Clouds para avaliação.]
It’s that simple: Formula Legends is a must-have for Formula 1 fans, who on the Nintendo Switch may feel “forgotten” by the category’s official racing games. Although it has a difficulty level that some might consider a bit overwhelming, the game excels at everything it sets out to do, and it offers a lot. Drive cars from the 1960s, 1970s, 1980s, 1990s, 2000s, 2010s, and 2020s in a robust story mode or in custom modes. Choose different versions of 14 circuits and train to become the fastest in this game that blends arcade elements with simulation. The visuals are cool, the unlockables are varied, the sensation of speed is high, the replayability is also high, and the price is affordable. It just needs a little optimization, which the developers should address in the future. One of the best motorsport experiences available on the Nintendo Switch – e está em português brasileiro.
[A coluna acima reflete a opinião do redator e não do portal Project N]
1 Comentário