No console que tem Animal Crossing: New Horizons, surpreender com um jogo de fazendinha cozy game (jogo aconchegante, confortável de se jogar) não é tarefa fácil. Mas My Time At Sandrock, sequência de My Time At Portia, consegue. E a chave para alcançar esse feito é muito simples: originalidade.
O novo jogo da desenvolvedora Panthea Games não tenta entregar uma experiência aos moldes de outros títulos. Na verdade, ele encontra um caminho próprio e é forte candidato ao título de “meu primeiro RPG”. Para fazer uma analogia com comida, é como um bom bolo: leva farinha, ovos, açúcar, leite e chocolate. E com ingredientes bons assim, o sabor só pode ser gostoso no final.
O “pulo do gato” está na história. Esqueça Tom Nook e uma dívida infinita. Aqui você é o grande “salvador da pátria”, o construtor que veio para reerguer a comunidade de Sandrock. A melhor explicação está no site da desenvolvedora:
“My Time at Sandrock é um RPG de aventura que se passa em um mundo pós-apocalíptico saudável. Comece uma nova vida na encantadora cidade de Portia! Restaure uma oficina negligenciada à antiga glória, cumprindo missões, cultivando, criando animais e fazendo amizade com os peculiares habitantes desta encantadora terra pós-apocalíptica!”
Em outras palavras, um belo exemplar de jogo de fazendinha cozy game. E a descrição da eShop, onde o título é vendido a R$ 195,36 na versão standard ou R$ 251,75 na versão deluxe, dá ainda mais informações. O jogo te posiciona “300 anos após o Dia da Calamidade ter destruído a maioria das tecnologias modernas”.
“Viaje para a comunidade desértica de Sandrock e assuma o papel de um Construtor iniciante. Use seu confiável conjunto de ferramentas para reunir recursos, construir máquinas e transformar sua oficina degradada em uma instalação de produção bem lubrificada para salvar a cidade das garras da ruína econômica”.
O restante é fácil de imaginar. Colete recursos – mas sem cair no clichê de derrubar árvores, já que se trata de um deserto, onde folhagens são escassas e cortá-las lhe renderá multas -, gerencie inventário, tenha sua própria plantação. Mas o mais importante: construa e viva!
Em Sandrock, diferente de outros games, cada NPC tem uma história interessante, uma missão específica que vale a pena ser acompanhada. Então a dica é: não pule os diálogos! O jogo está 100% legendado em português brasileiro, então aproveite e jogue com calma.
Os gráficos não estão em primeiro plano. São bonitos, mas nada de excepcional. Isso porque outras características se sobressaem, como o relacionamento com outros personagens, que é imprescindível. Nesse aspecto, My Time At Sandrock se assemelha muito a Stardew Valley. Mas aqui o combate vai além.
O lore é todo próprio. Ou seja, nada de aranhas genéricas, lobos malvados ou ratos selvagens. Você vai enfrentar inimigos autênticos, como um lagarto (animal que realmente vive no deserto) que usa arma de fogo, uma “Formiga Operária de Mel Quente de Churrasco”, um “Yakmel Selvagen” e muitos outros. São, ao todo, 61 espécies diferentes.
Nos tutoriais você aprende a combater em um divertido duelo contra um habitante da vila, ao melhor estilo “luta livre”, mas na prática, vai lidar com os monstros que estão espalhados pelo mapa. Só que, se decidir lutar contra algum que tenha nível maior que o seu, vai passar um sufoco.
Sim! Existe um sistema de níveis, com experiência, árvore de habilidades e tudo o mais. E os monstros são divididos em categorias (Normal, de Elite e Chefe). Para enfrentá-los, você não vai usar as tradicionais picareta e machado. Estas ferramentas são exclusivas para a coleta de recursos, deixando lugar para armas como as lanças e outros tipos de lâminas. Só que todas as ações consomem energia, então faça tudo com estratégia.
Resumindo: My Time At Sandrock é sobre criação de personagem, exploração, coleta de recursos, gerenciamento de inventário e relacionamento entre NPCs. Mas também é um completo RPG que pode ser um bom ponto de partida – principalmente para o público infantil -, já que apresenta modelos fofinhos e uma história fácil de ser acompanhada, mas com muitos, muitos recursos mesmo, que são obrigatórios neste tipo de experiência, como enfrentar mobs, ganhar experiência, subir de nível e adquirir novas habilidades.
Tudo isso enquanto, de quebra, você deixa de ser um Construtor Iniciante para dominar a arte da construção, trabalha para reerguer uma comunidade e claro, cuidar de uma plantação, de animais e também contribuir para o uso racional da água, que é um recurso escasso no deserto.
Conclusão
My Time At Sandrock é um excelente jogo, mas acredito que a experiência completa seja atingida jogando com alguém iniciante no mundo dos games. Imagine um pai, ou uma mãe, jogando com o filho(a). Nessa configuração, pode ser uma escolha melhor que Animal Crossing: New Horizons, que além de estar em inglês, não faz questão de explicar muito das coisas, deixando diversas camadas do jogo no campo do subtexto.
Em muitos aspectos, o game da Panthea lembra muito um jogo de tabuleiro. As instruções são muitas, e você pode ler e entender cada minúcia do jogo (principalmente se estiver jogando na TV, já que no modo portátil as letras ficam pequenas), cada aba do menu, como “Personagem”, onde é possível, entre outras coisas, mudar a roupa do personagem; “Inventário”, para gerenciar os muitos itens disponíveis ao longo da jornada de mais de 60 horas; “Mapa”, para navegar por todo o perímetro; “Missão”, onde estão os detalhes das quests; “Manual”, com detalhes de todas as inúmeras construções que podem ser feitas, desde a clássica “mesa de trabalho” à máquinas mais complexas; “Social”, onde estão as fichas dos NPCs, para que os relacionamentos possam evoluir; “Calendário”, para acompanhar tudo o que acontece em Sandrock; “Conhecimento”, que guarda uma muito bem vinda árvore de skills; “Álbum”, para ver fotos tiradas com a câmera do jogo; e “Enciclopédia”, com coleções de itens, animais, árvores e arbustos.
Mas você também pode não ler nada disso, e ainda assim encontrar diversão de outras formas, seja coletando recursos, acompanhando a história dos outros moradores da comunidade, ou enfrentando inimigos espalhados pelo mapa, que lembram muito, mas muito, a fórmula mais básica dos melhores MMOs dos anos 2000.
Naturalmente o muito vai te instigar a explorar. Um dos melhores exemplos disso é um cartaz de “Procurado” que está colado ao lado da porta da Guilda do Comércio, onde você vai entrar muitas e muitas vezes. Ao clicar para ler o que está escrito, vai aparecer o seguinte: “Procurado: Vivo ou Morto. Se você vir este homem, não se envolva: informe imediatamente ao Corpo Civil. Qualquer informação que leva à prisão e condenação deste vil perpetrador será generosamente recompensada, no valor de 100.000 gols”. Parecer ser uma tentadora investigação, não?
Agora junte este fator a um visual lúdico e some com a possibilidade de cuidar de uma plantação, fazer uma cidade crescer e decorar a própria casa, isso sem falar da personalização de roupas, cabelos e por aí vai. A receita é boa, e o produto entrega!
[Nota do Editor: My Time At Sandrock foi analisado a partir da sua versão para Nintendo Switch. A cópia do jogo foi gentilmente cedida pela Focus Entertainment para avaliação.]
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