Yooka Laylee and the Impossible Lair – Criatividade e diversão

Yooka Laylee and the Impossible Lair – Criatividade e diversão

Quando Yooka Laylee foi lançado em 2017, fruto de uma das mais espetaculares campanhas de crowdfunding da história dos games, a nova aventura no estilo de Banjo Kazooie dividiu opiniões, com muitos elogiando o visual e a personalidade porém criticando o level design e a fluidez. Naturalmente, quando se espelha em um clássico dos games para a criação de algo apoiado na nostalgia, qualquer resultado que não seja puramente espetacular vai deixar um gosto amargo na boca de muita gente.

Por tais motivos, uma sequência para tal jogo não era esperada por ninguém, porém a desenvolvedora Playtonic surpreendeu a todos em 2019 ao anunciar Yooka Laylee and the Impossible Lair, uma nova aventura dos mascotes, e ainda mais surpreendente era o fato de que este novo jogo contava com uma migração de estilos, saindo do collectathon para o platformer 2D, inspirado principalmente na série Donkey Kong Country.

Não há nada de usual em nenhuma informação apresentada sobre a sequência do jogo, e o risco que a Playtonic tomou com este projeto não é pouca coisa. No entanto, agora que já experienciei o resultado desta experimentação arriscadíssima, posso dizer com total confiança: eles sabiam MUITO BEM o que estavam fazendo.

Yooka Laylee and the Impossible Lair – Criatividade e diversão
Arte promocional do jogo.

Yooka Laylee and the Impossible Lair, apesar de ter uma referência clara para o design de suas fases, traz consigo uma abundância de inovações e ideias altamente criativas, que tratam de elevar a jogabilidade e transformam o jogo numa experiência divertidíssima.

Nesta nova aventura, Yooka e Laylee se veem no meio de uma batalha entre o vilão Capital B e o reino das abelhas, sendo que o vilão aprisionou o principal batalhão do grupo, composto de 48 indivíduos, e agora ameaça a todos escondido dentro do seu “Impossible Lair”, um calabouço praticamente impossível de se penetrar. E é justamente este o primeiro lugar que visitamos no jogo. Sim! Este jogo te coloca logo de cara na última fase!

O nome “Impossible Lair”, aliás, não é um eufemismo, pois o lugar de fato apresenta um desafio SERIAMENTE difícil, que não perdoa absolutamente nenhum erro. Portanto, é esperado pelo jogo que falhemos nesta primeira tentativa, e nesta ocasião é que vamos parar no reino das abelhas. Por lá, cada uma das fases permite o resgate dos membros do batalhão (ou Beetalion, em inglês, pois o jogo não desperdiça nenhum trocadilho), que podem ser utilizados como escudo para as próximas tentativas de desbravar o Impossible Lair. Cada abelha resgatada nos permite sobreviver a um dano a mais nas tentativas de desbravar o calabouço final, e tentativas são permitidas a qualquer ponto da progressão.

Os visuais impecáveis e o humor autorreferencial, aliados a uma trilha sonora espetacular (da qual trataremos mais adiante), prendem a atenção do jogador durante todo o tempo. O departamento de direção de arte da Playtonic realmente merece um aumento. Todas as ambientações são espetaculares e os ambientes das fases são cautelosamente esculpidos e apresentam várias camadas, tanto na área de jogo quanto mais ao fundo na composição.

Yooka Laylee and the Impossible Lair – Criatividade e diversão
As belíssimas ambientações compõem ambientes complexos e altamente variados.

O level design é um ponto fortíssimo por aqui. Nas fases, o objetivo ao final é libertar uma abelha, e, como de costume em platformers, há, ao longo do percurso, cinco moedas colecionáveis. Tanto na temática quanto nas mecânicas apresentadas, o jogo se mantém criativo e interessante, e realmente não consigo lembrar-me de uma fase ruim ao longo de minha experiência. Em meio a visuais fantásticos e ótimas ambientações, no entanto, existem desafios que não têm medo de testar a habilidade do jogador em controlar totalmente os movimentos da duplinha. Não há nada aqui que requeira tanta tentativa e erro como em Celeste ou Super Meat Boy, mas mesmo assim, este não é um jogo fácil.

Se as fases já são ótimas, o mapa do overworld é o lar das mais criativas ideias do jogo. Nele, em vez de apenas caminharmos linearmente de uma fase para outra, temos também desafios de progressão, em um vasto espaço em 3D cheio de puzzles, com suas próprias mecânicas, onde as fases nos são apresentadas por meio de livros abertos. O jogo pega o que foi apresentado nos hubs de Super Mario 3D World e expande muito sobre tal ideia.

A coesão entre o mundo aberto e as fases presentes nele está, no entanto, na maneira como podemos alterar o design das fases por meio de ações no overworld. Todos os níveis aqui apresentam duas versões, uma “original” e outra que é resultado de uma intervenção no mapa, e as ideias que este conceito apresenta são imensamente criativas e variadas! Há, por exemplo uma situação em que o livro se encontra numa ponte e, ao erguermos a ponte no overworld, a fase se torna uma progressão inteiramente vertical. Em outro caso, quando se desvia o curso do rio no hub para passar por cima do nível, a fase molda-se para apresentar obstáculos aquáticos.

As moedas coletadas durante as fases podem ser utilizadas para pagar as Paywalls do NPC Trowzer (que são literalmente paredes removíveis chamadas dentro do jogo de Paywalls) e avançar ainda mais no cenário. Os mini-desafios do NPC Pagie, apesar de não nos fazer progredir para outras áreas, alteram o cenário onde já estamos, abrindo neles novos percursos.

Yooka Laylee and the Impossible Lair – Criatividade e diversão
As literais Paywalls do jogo.

Além de tudo, podemos encontrar no mundo aberto Tônicas que são liberadas para compra com os Quills (o dinheiro do jogo) e, quando equipadas, influenciam na maneira como jogamos as fases. A maioria delas é simplesmente estética, porém algumas conferem novas habilidades aos protagonistas e tornam o jogo mais fácil ou difícil, sendo que o balanceamento destas mecânicas vem por meio de uma mudança na quantidade de Quills que se coleta durante as fases. Tônicas que facilitam o jogo diminuem a quantidade de Quills que se obtém, e o contrário também ocorre.

A proposta de um mapa com seus próprios desafios aliada à excelente ideia de interferir no design das fases por meio de ações em seu exterior tornam facilmente o overworld de Yooka Laylee and the Impossible Lair o melhor de qualquer platformer 2D que já joguei.

Yooka Laylee and the Impossible Lair – Criatividade e diversão
O overworld, repleto de charme e também de puzzles e desafios.

A trilha sonora é um show à parte. Composta pela parceria dos veteranos David Wise (Donkey Kong Country) e Grant Kirkhope (Banjo Kazooie) com os “novatos” Matt Griffin e Dan Murdoch, a soundtrack traz uma música original para cada versão das fases (na prática, duas músicas por fase), com composições vívidas e sofisticadas que realmente nos transportam de volta para a era de ouro da Rare. Tenho escutado a trilha sonora do jogo em loop, mesmo quando estou trabalhando, desde seu lançamento.

Se eu tenho uma crítica a fazer ao jogo é ao fato de que, repetidas vezes, as fases “fecham uma porta” que bloqueia o caminho para trás, o que se provou frustrante sempre que percebia que estava ao final dos levels e tinha perdido algum colecionável. Considerando-se o formato que as fases seguem, sendo que poucas delas apresentam eventos do tipo “time attack” ou “quick time event”, creio que o design das mesmas não sofreria em nada ao permitir que o jogador fizesse voluntariamente um backtracking a fim de procurar o que pode ter deixado para trás.

Yooka Laylee and the Impossible Lair foi uma surpresa altamente agradável, e é um jogo que mais pessoas deveriam jogar. Com mecânicas muito criativas, uma direção de arte impecável e o melhor overworld já apresentado em um platformer 2D, este jogo posiciona-se no mesmo patamar de qualidade que a série que o inspirou. Com dois jogos em dois estilos diferentes até agora, mal posso esperar para ver para onde a Playtonic leva Yooka e Laylee na próxima aventura!

[rwp_box id=”0″]


[A coluna acima reflete a opinião do redator e não do portal Project N]

É arquiteto, mas se formou falando sobre design de games. É músico, mas compõe inspirado em trilhas de games. Escreve, mas escreve sobre games. Deu pra pegar o tema? :)