Passei toda minha infância em Jaciara, no interior do Mato Grosso. Uma cidade pequena, ensolarada, extremamente quente e bem arborizada. Hoje, adulto, aos 20 anos de idade, habito a capital paranaense, Curitiba. Geralmente nublada, às vezes fria demais e cinza – pelo menos nas partes que mais frequento. Minha infância e vida adulta me remetem sentimentos diferentes, quase antagônicos, não só por conta do espaço em que são localizadas – eu amo o frio e o céu nublado de Curitiba assim como gostava do calor e do sol mato-grossense – mas principalmente por causa da minha relação com o videogame.
Quando criança, a partir do momento do clique no botão power do meu Nintendo Wii ou DS, eu me desligava. O tempo parava de fazer sentido. Eu perdia horas e horas onde eu quisesse… viajando entre galáxias, me tornando um mestre pokémon, andando pelos trilhos de Hyrule. Sexta-feira, é verão, choveu a tarde toda, mas a água nas ruas e calçadas parece evaporar por conta do calor. Eu consigo me lembrar exatamente da sensação que era jogar sem me preocupar com absolutamente nada que não fosse o próprio jogo, e me angustia saber que, hoje, não me sinto da mesma forma. Jogar é sempre prazeroso, mas, sendo adulto, o meu envolvimento com o videogame é diferente: às vezes sinto culpa, às vezes não sinto vontade, às vezes não consigo não jogar por um dia todo, às vezes sinto como seu eu estivesse procurando reviver o que sentia ao me aventurar pelos jogos durante minha infância.
Percebi logo quando joguei no meu Nintendo Switch pela primeira vez, em Pokémon Shield. Confesso que o jogo me decepciona em diversos pontos, mas ainda é Pokémon. É um jogo menos simples se comparado às gerações passadas, afinal, é o primeiro da série principal feito pra um console ‘de mesa’, no entanto, além de não me sentir 100% vidrado e apaixonado pela possibilidade de capturar monstros, lutar em ginásios e viver a história do jogo, como costumava ser quando criança, estive constantemente preocupado com meus compromissos no trabalho e faculdade. Não é como se eu realmente tivesse algo pra fazer que não fosse jogar, não é consequência da minha procrastinação. Não sei se é algo que o eu adulto tem que o eu criança não, ou o contrário. Talvez seja apenas neurose, talvez eu seja mais uma vítima dessa condição maluca que diz que devemos estar o tempo todo produzindo algo. A única coisa que sei é que amadurecer a esse ponto é doloroso.
É claro que eu ainda amo jogar, afinal, escrevo aqui como entusiasta e colunista de um portal de notícias sobre Nintendo, mas sinto falta de ser como era há oito, nove, dez anos atrás. Me preocupa saber que não existe remédio para tal problemática, e que nem mesmo o desabafo pode suprimi-la, mas, por muito tempo segui na esperança desesperada de que algum dia encontrarei o jogo que fará com que eu perceba que o problema não está em mim, mas no que joguei até então. E eu sempre soube que ele não viria, apenas demorei a aceitar.
Agora, colocando na balança os impactos subjetivos de me tornar um adulto que joga videogames, descobri que é possível sentir preguiça de jogar. Serei recebido com muito espanto pelos moradores quando voltar para Gaylândia – minha ilha em Animal Crossing New Horizons – porque tive preguiça de abrir o jogo no último mês. Também percebi que, por bem ou por mal, será necessário abrir mão do lazer em prol dos meus compromissos. E tá tudo bem, infelizmente faz parte. Mas, jogar videogame não é, e não vai voltar a ser, como foi durante minha infância. Me parece que minha criatividade – que eu considero fundamental para jogar – foi condicionada para outras finalidades, e isso é realmente algo a ser discutido no que se refere ao sistema de ensino brasileiro, porém, não pretendo me aprofundar por aqui, muito menos apontar culpados para minha situação… de qualquer forma, a minha conclusão é que minha criatividade, então condicionada, me impede de viver a história de um jogo como costuava viver durante minha infância.
Hoje, quando faz muito frio e a luz do sol mal chega à sala de casa, quando toco o Pro Controller e minha mão parece congelar, lembro que nunca senti isso na minha infância. São tempos, espaços, climas, Franciscos diferentes. Só resta me perguntar se o pequeno Francisco gostaria de estar no meu lugar assim como eu gostaria de revivê-lo.
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