Em 1931 o ator húngaro Béla Ferenc Dezső Blaskó, mais conhecido como Béla Lugosi, entrou para a história ao interpretar Drácula no atemporal filme que leva o nome do conde e contribuiu imensamente para o cinema de terror. Em 2024, nem a inevitável morte (que aconteceu há 68 anos) o impediu de voltar. Carpathian Night Starring Bela Lugosi, indie lançado pela Tezcatek em parceria com a Lugosi Enterprises, marca o retorno do intérprete do vampiro – e também a estreia dele em um videogame – além de representar uma grande adição ao estilo “classicvania horror platformer” (“clássico jogo de terror de plataforma”).
Antes de mais nada, é preciso dizer que Carpathian Night Starring Bela Lugosi é uma ode aos jogos da série Castlevania, em especial os títulos 8 bits e alguns dos 16 bits também. A referência é de um tempo em que o sufixo “vania” ainda não havia se juntado ao prefixo “metroid”, e os elementos de plataforma e terror eram as principais características da franquia.
Dito isso, vamos à história:
Transilvânia – 1451. A praga do Exército de Drácula continua à se espalhar pelos Cárpatos, tornando-se cada vez mais forte à cada nova vítima feita. Aqueles que tentam resistir, enfrentam um destino pior que a morte. Se Drácula não for detido, ele trará a noite eterna para o mundo.
Apenas dois campeões responderam ao chamado para trazer justiça divina à Dracula e seus asseclas. Abade Dorin, monge guerreiro e líder do Monastério Kelemen, e Irina Dracul, vampira, piromante e descendente do Príncipe Drácula, se uniram para expulsar o Exército dos Mortos e caçar o próprio vampiro lendário. Zumbis, vampiros, lobisomens, fantasmas e seres demoníacos de todos os tipos aguardam aqueles que ousam invadir o domínio de seu mestre! Aqueles que sobreviverem aos horrores da Passagem de Borgo chegarão aos portões do antigo Castelo do Drácula, onde começa o verdadeiro pesadelo!
Agora, nas palavras dos desenvolvedores: “Abra caminho através do campo infestado de monstros, escape de armadilhas e ciladas mortais, supere os comandantes de Drácula e descubra a história secreta de seus inimigos monstruosos. A noite lhe espera.”
E é isso mesmo, em uma estrutura que valoriza o que funcionava no passado, complementando com o que funciona no presente. O jogo é dividido por fases, sempre com um boss ao final de cada seção. Mas, diferente do que se via em Castlevania, a dificuldade é mais justa.
Funciona assim: não há um limite de vidas para passar as fases. Em vez disso, há um contador de mortes ilimitado. É evidente que concluir uma seção sem morrer – ou morrendo poucas vezes – é o ideal, porém se não for esse o caso, não tem problema. E isso é muito positivo, já que Carpathian Night Starring Bela Lugosi é uma experiência muito pautada no retrô e na nostalgia.
Com “retrô” e “nostalgia” eu quero dizer que não há movimentações mirabolantes ou então inovações especialmente criativas. A fórmula é a que funciona há literalmente 40 anos: controle do personagem com o D-PAD (quem tem Switch Lite se beneficia) ou com o analógico esquerdo; botão Y para atacar (pode ser usado para os lados e para cima); botão B para pular e botão + para pausar. As exceções são as muito bem-vindas implementações de recursos modernos com os botões L e R, que representam respectivamente Dash e Skill (leia mais abaixo).
Já os combates são igualmente simples, mas estão longe de serem simplistas. Com Abade Dorin você usa uma lança, e com Irina Dracul um chicote (onde será que eu já vi isso?). Há inimigos que morrem com um acerto apenas, mas há outros que precisam de dois ou mais golpes. Já você, a cada hit que leva perde quantidade significativa de vida. Contudo, o “sangue”(e também mana – leia mais abaixo) pode ser recuperado ao acertar tochas e pedestais iluminados por fogo, que derrubam corações que enchem sua vida.
Aliás, vale mencionar que, antes de cada luta contra chefes o jogo entrega quantidade suficiente de corações para que você tenha condições de enfrentar a luta. São exemplos como este, e também o dash e as habilidades desbloqueáveis, que mostram como os desenvolvedores foram felizes ao adotar recursos modernos, mas que não tiram as características típicas de um “classicvania horror platformer”.
Essência retrô
Em parceria com a Lugosi Enterprises, a Tezcatek tem a honra de trazer Bela Lugosi para o mundo dos videogames pela primeira vez em um lançamento oficialmente licensiado, em um estilo de jogo que à muito é associado aos clássicos do terror.
Carpathian Night é uma homenagem aos side-scrollers de terror retrô e aos clássicos filmes de monstros que os inspiram. Lute contra legiões de monstros icônicos, escape de armadilhas mortais, descubra a história secreta de seus inimigos monstruosos e enfrente o lendário Senhor dos Vampiros em sua rópria casa ancestral! Atenda ao chamado, poderoso caçador, e expulse a maldade, mandando-a de volta para onde veio!
Em um cenário em que a Konami não produz novos Castlevanias, e considerando que os últimos lançados (inclusive os sucessores espirituais, como Bloodstained: Ritual of the Night) foram na linha de Symphony of The Night e outros metroidvanias, Carpathian Night Starring Bela Lugosi “nada de braçadas” no mercado, e ainda atende a dois públicos com uma chicotada só, para fazer uso de um trocadilho.
Quem gosta da essência de plataforma de terror, em que é preciso andar com cautela, desviar dos ataques inimigos e utilizar as armas com agilidade e sabedoria, tem aqui um prato cheio. E quem prefere a exploração também.
Isso porque o jogo lançado pela Tezcatek em parceria com a Lugosi Enterprises, além de mais uma vez estampar o rosto de Béla Lugosi como o conde Drácula, também apresenta elementos de collectathon, e ao fazer isso se distancia dos consoles Nintendo Entertainment System e Super Nintendo e se aproxima mais do que foi visto no Game Boy Advance.
Em cada fase há quatro “skill gems” para coletar, que são gemas verdes usadas para a compra de skills. Sim! Há habilidades debloqueáveis, como uma em que o Abbot Dorin se projeta para frente, atingindo o inimigo a partir do comando → + R, ou outra em que ele vai para cima utilizando ↑ + R.
Conforme o jogo avança e você coleta mais gemas, as habilidades desbloqueadas vão ficando mais complexas, mais poderosas e também consomem mais mana, que é adquirida ao acertar os pilares de fogo (o drop será do que você mais precisa no momento, seja vida ou mana).
E além dessas gemas, também ficam posicionados em locais difíceis de alcançar, que exigem da habilidade, da paciência e da desenvoltura do jogador, os colecionáveis que acrescentam em história. Também são quatro por fase, e a cada um deles você vai preenchendo lacunas do enredo, assim como acontece com os “files” (“documentos”) da franquia Resident Evil.
Há inclusive um menu para acompanhar a “Lore”, que só pode ser compreendida totalmente ao encontrar todos os coletáveis, e ainda um outro para conquistas in-game. Infelizmente o jogo não está disponível em Português Brasileiro, então a compreensão da trama pode ser prejudicada para quem não domina a língua inglesa. Mas fique tranquilo: é possível jogar normalmente em inglês, já que o gameplay é intuitivo e os tutoriais são visuais.
Falando em visuais, tudo impressiona positivamente. Dentro do jogo, os sprites são bem feitos. Fora do jogo, os menus, artes das fases e dos personagens são bem feitos também. A trilha sonora pode soar repetitiva em determinados momentos, mas a vibe 8 bits faz com que as músicas soem bem também. Mas o que brilha mesmo é a direção de arte, soturna, misteriosa, com inimigos horripilantes e aquela boa e velha sensação de estar sozinho em um mundo hostil, gótico e medieval.
Até o preço é positivo. São R$ 52,49 na eShop brasileira, o que é um valor mais do que justo pela experiência, que embora curta (aproximadamente quatro horas de jogo) é constante em qualidade do início ao fim. No entanto, o pacote é válido quase que única e exclusivamente aos retro gamers, não oferecendo grandes atrativos aos jogadores que preferem experiências novas.
Nota do autor¹: Talvez o maior “defeito” de Carpathian Night Starring Bela Lugosi (e digo isso entre aspas, pois não é exatamente uma falha do jogo) seja não ser conhecido pelo grande público. Mais pessoas deveriam dar uma chance ao título, que é, sem exageros, um hidden gem dos tempos atuais quando o assunto é indie retrogame inspirado em Castlevania.
Nota do autor²: Ao Project N a Tezcatek revelou que há brasileiros entre as pessoas que participaram da produção do jogo. E isso é uma excelente notícia! É o Brasil envolvido em um projeto de qualidade e que tem a licença oficial do ator Béla Lugosi, o conde Drácula de 1931!
By reviving the best of the first Castlevania games and adding important quality of life features to the traditional experience, Carpathian Night Starring Bela Lugosi does well and positions itself as a hidden gem among indie games inspired by classics.
[Nota do Editor: Carpathian Night Starring Bela Lugosi foi analisado a partir da sua versão para Nintendo Switch. A cópia do jogo foi gentilmente cedida pela Tezcatec para avaliação.]
1 Comentário