Se menos é mais, Bakeru é mais em tudo. É mais diversão, é mais alegria, é mais videogame. Isso porque ele vai em um caminho simples, mas não simplista. Indo direto ao ponto: é um jogo de ação 3D ambientado no Japão e regado com o melhor da cultura nipônica. A jogabilidade apresenta elementos de plataforma, de beat ‘em up e de collectathon. É muito conteúdo para ver e explorar, e durante toda a jogatina o sorriso no rosto de quem joga é uma certeza todo o tempo.
Essas palavras podem até parecer, mas não são hipérboles. O jogo desenvolvido pela Good Feel e publicado pela Spike Chunsoft é tudo isso mesmo, desde que jogado da maneira certa. E ainda por cima é um sucessor espiritual da série Ganbare Goemon / The Legend of the Mystical Ninja, com direito a participação direta do o game designer Etsunobu Ebisu (leia mais abaixo, no texto de Paulo Oliveira).
A aventura de Bakeru começa neste jogo de ação selvagem ao estilo japonês! Desastre atinge o Japão! Oracle Saitaro e suas Tropas do Festival estão usando um festival bizarro para dominar o Japão. Bakeru viaja para 47 prefeituras japonesas para libertar o Japão das garras dos espíritos malignos! Ação espetacular ambientada no conto de fadas do Japão! Bakeru se passa no “Fairy Tale Japan”, uma mistura do Japão moderno e dramas de época antiga, dividido em mais de 50 palcos. Continue lutando com o tambor de Bakeru!
Dito isso, o protagonista é um tanuki (cão-guaxinim nativo do Japão que é mundialmente famoso pela crença de que atrai prosperidade e boa sorte – leia mais aqui. É a mesma espécie de animal de Tom Nook, de Animal Crossing, e também da roupinha do Mario em Super Mario Bros. 3) que se transforma em um ser humano para combater o mal. E sabe que armas ele usa? Baquetas de tambor, iguais as dos jogos Taiko no Tatsujin. Se isso não é Japão total, eu não sei o que é.
Gameplay
No liquidificador, misture Super Mario Odyssey com Super Mario 3D World com Kirby and The Forgotten Land. Adicione uma pitada de beat ‘em up, com vários elementos de collectathon. E uma pitada de Crash Bandicoot também, com um pouco de jogos licenciados em filmes, desenhos e quadrinhos, como Naruto Uzumaki Chronicles 2 (cuja voz do protagonista lembra bem a do nosso herói tanuki-humano). Essa receita maluca é Bakeru, que te leva de volta para os anos 1990, ou para os anos 2000, onde os hoje muito comuns “elementos de RPG” não eram tão presentes, o que dava espaço para a praticidade de ligar e jogar.
Há um mapa-múndi (onde a princípio você anda a pé, mas depois desbloqueia uma nave que é um bule gigante, aos moldes do chapéu gigante de Super Mario Odyssey) e você escolhe a fase, joga e se diverte. Simples assim.
A maioria das fases são do gênero ação/plataforma em 3D, em que você precisa cumprir com alguns objetivos e conta com combate corpo a corpo com vários golpes, sendo cada botão do Nintendo Switch responsável por um braço do protagonista. Em primeiro lugar, desça as mãos (ou melhor, as baquetas) em tudo o que se mexe. Isso lhe renderá moedas, que você pode usar para comprar itens consumíveis na lojinha (sim, tem lojinha!), ou então corações extra (alô, Zelda!) ou ainda máscaras decorativas. E isso também lhe renderá “combustível” para encher uma barrinha colorida que te permite se transformar em várias coisas diferentes.
Não vale a pena dar muitos spoilers sobre as transformações, mas você pode ficar pequeno para passar em determinadas passagens, pode ficar muito forte para vencer inimigos com mais facilidade, pode usar uma habilidade para atacar vários adversários de uma só vez e também pode atirar à distância. Porém, o tempo de uso dessas transformações é limitado, já que a barrinha vai esvaziando com o uso.
E para além desse objetivo de bater em tudo o que se move, há também o fator collectathon (Alô, Super Mario 64! Alô, Banjo-Kazooie!). Para liberar o grande totem que lhe permite encerrar a fase (funcionando como a bandeira de Super Mario, ou o gongo em Croc: Legend of the Gobbos, que recentemente teve um remaster anunciado) você precisa encontrar e bater até quebrar três luminárias japonesas grandes e coloridas. Esses são os colecionáveis “obrigatórios” de cada fase, mas há pelo menos mais oito para serem encontrados.
Como o jogo é uma grande aventura pelo Japão, existem as cinco “trivias”, que trazem curiosidades sobre o país. E também os três “souvenires” de cada fase, que representam a cultura de cada uma das prefeituras visitadas. Sempre há uma flâmula do local e também itens que o representam, como uma comida ou um objeto típico.
E você já sabe. Para completar 100% é preciso pegar tudo, o que eleva bastante o tempo de jogatina, mas com qualidade e não apenas quantidade.
Variedade
As semelhanças com os jogos citados acima não se limitam apenas ao mapa-múndi. Quem se lembra de Crash Bandicoot: Warped, em que as fases de plataforma ganhavam um respiro com com mecânicas diferentes, em que se pilotava um carro, um avião e até mesmo se montava em um tigre? Aqui é a mesma coisa, mas em um estilo muito mais oriental.
Há um cachorro vermelho (e bem quadrado, como se fosse feito de papel) em que você monta. E ele se transforma em um carro, em um jet ski e em um avião, dando variedade à experiência, que ganha elementos de jogos de corrida e de shoot ‘n up. Muito bom.
Ambientação
Jogar Bakeru é como visitar cada cantinho do Japão. Cada fase representa o estilo de um local, e por isso há ambientes tradicionais, mas também há cenários modernos (alguns inclusive lembram a franquia Splatoon). E tudo é muito colorido e dá vontade de explorar. Se você tiver um nível legal de inglês, vai conseguir captar muitas curiosidades do país a partir das trivias coletadas (sim, infelizmente o jogo está apenas em inglês).
Na maior parte do tempo, o nível de dificuldade de Bakeru pode parecer tranquilo, inclusive nas batalhas contra chefes, que consistem em identificar o padrão de ataque dos inimigos e então contra atacar. Porém, com o avançar das fases, fica claro que o desafio está ligado a duas questões específicas: a quantidade de inimigos na tela, já que eles te cercam e aí fica difícil sair ileso, e o quão escondidos estão os coletáveis.
Minha dica é: jogue no ritmo certo. Completar muita fases em sequência pode ser cansativo, talvez até repetitivo. Mas jogar uma ou duas fases apenas pode trazer e melhor experiência possível, deixando um “gostinho de quero mais”.
Tudo é bom, tudo é bem feito, inclusive a trilha sonora, que traz à tona o melhor do Japão. Sério, clique aqui e escute o tema principal que você vai ficar empolgado na hora. As maiores falhas são não a falta de localização para o português brasileiro, o que traria muito mais imersão na cultura japonesa, já que além das curiosidades das trivias a história é contada por meio de cenas em estilo HQ/Mangá, com bastante texto para ler; a ausência de marketing agressivo no ocidente e também a falta de situações que incentivam o uso de certas transformações, como a de ficar pequeno, que não é muito utilizada durante o jogo.
Custo x Benefício
Sobre o marketing no ocidente, eu explico. Bakeru foi lançado originalmente para Nintendo Switch em 2023, mas somente no Japão. Você estava sabendo disso?
Pois é. Neste ano a publisher Spike Chunsoft e a desenvolvedora Good Feel decidiram publicar o jogo no ocidente também, neste mês de setembro. E o material é de extrema qualidade e conta inclusive com conteúdo exclusivo para este lado do mundo (novos ataques “Furacão” e “Peão Giratório” e inimigo adicional “Chefe Lanterna”) mas pouca gente ficou sabendo do lançamento… É uma pena, porque o jogo é tão bem feito que parece até ter sido feito pela Nintendo, sabe? Tem aquele “selo Nintendo” de qualidade, de diversão para toda a família.
De qualquer forma, é para comemorar o lançamento em inglês, como o redator Paulo XXXXXX explica a seguir. E falando em qualidade, a relação Custo x Benefício literalmente se paga. São R$ 199 na eShop brasileira, mas considerando as muitas horas de jogatina e qualidade que se equipara a Super Mario e outros grandes títulos, vale a pena. E tem versão demo gratuita, então não tem erro!
Bakeru é o renascimento da série Ganbare Goemon / The Legend of the Mystical Ninja
Paulo Oliveira
Embora seja um plataforma 3D com ótimas avaliações, mas nem tão celebrado pela mídia, Bakeru representa o renascimento criativo de uma franquia de bastante renome, a série Ganbare Goemon.
Ganbare Goemon (literalmente traduzida como “Vai, Goemon!”) teve o seu primeiro jogo lançado em 1986 pela Konami para arcade e tem como principal colaborador o game designer Etsunobu Ebisu. Através de uma vida bastante fértil, a série se espalhou por 29 jogos eletrônicos lançados para as mais diversas plataformas, indo desde o NES 8 bits até modernos aparelhos celulares.
Os jogos da série contam as aventuras de Goemon, um personagem inspirado em Ishikawa Goemon do folclore nipônico que muito se assemelha ao nosso Robin Hood e ainda hoje povoa inúmeras produções da cultura pop (o personagem Oden de One Piece é inspirado em Ishikawa Goemon, por exemplo).
Ganbare Goemon sempre foi focado na apresentação de figuras do folclore japonês e exploração com ênfase na geografia da ilha, ou seja, um jogo que sempre manteve uma forte premissa cultural. Por conta disso, sempre representou um desafio para as publishers americanas que ficavam em dúvida se jogos tão focados em elementos nipônicos poderiam ressoar no público ocidental. Foi por esse motivo que, apesar do sucesso no oriente durante a era dos 8 bits, o primeiro título realmente localizado para o ocidente só apareceu no início de 1992.
The Legend of the Mystical Ninja (como a série ficaria conhecida por estas bandas), misturava elementos de RPG e plataforma com maestria enquanto abusava do hardware do Super Nintendo para trazer gráficos divertidos e uma gameplay incrível, cheia de referências aos grandes sucessos da Konami. O jogo vendeu bem e já está disponível para quem tem a assinatura do Nintendo Switch Online (NSO).
Os anos 90 foram realmente grandiosos para a disseminação da cultura japonesa no ocidente. Animes, mangás, tokusatsus e muitos outros produtos culturais fizeram brotar um profundo carinho pela cultura nipônica nos jovens daquela época (eu incluso). Infelizmente, essa observação ainda não foi suficiente para convencer as publishers a trazer outros três jogos maravilhosos da série que foram lançados para o SNES (os quais eu recomendo imensamente, infelizmente nem todos possuem traduções por fãs).
O próximo jogo a chegar oficialmente por aqui foi o Mystical Ninja Starring Goemon, para o Nintendo 64, em 1998. Este foi, sem dúvidas, o jogo que mais popularizou a série por aqui. Gráficos fenomenais, exploração 3D de cenários japoneses com riquíssimos detalhes, quatro personagens jogáveis diferentes, trilha sonora sem igual e fortíssimas referências à cultura pop nipônica dos anos 90 fazem deste um jogo inesquecível para quem jogou na época (grande destaque para a música do robô gigante Impact!).
Outro título para Nintendo 64 foi lançado, o Goemon’s Great Adventure, no final de 1999. Desta vez, o jogo trazia uma gameplay de plataforma 2.5D muito semelhante ao segundo título lançado para o SNES, bem mais fluida e dinâmica que o seu antecessor 3D. O jogo ainda trazia a possibilidade de jogar em multiplayer coop e trazia fases riquíssimas e trilha sonora exuberante como já era de costume.
Vejam só que tristeza: de todos os 29 jogos lançados da franquia, apenas cinco foram oficialmente trazidos para cá, o que dá pouco menos de 20%! Fora os três grandes heavy hits que já foram citados, dois spin offs para os portáteis Nintendo também foram localizados: Mystical Ninja Starring Goemon (mesmo título do Nintendo 64), lançado para Game Boy apenas na Europa como parte de uma coletânea em apenas em 2000 quando seu lançamento original tinha sido em 1991 e ainda um segundo título com exatamente o mesmo nome (cuja caixa está representada ao lado) em 1998 (Isso já mostrava o pouco caso que a Konami fazia da série no ocidente).
Ganbare Goemon é uma franquia fantástica, cheia de jogos feitos com muito esmero em épocas onde a cultura japonesa estava ganhando o mundo. É bem verdade que os últimos quatro ou cinco lançamentos da série não foram tão relevantes quanto os demais mas, ainda assim, sobram 19 que valem muito a pena serem conhecidos e que nunca deram as caras por aqui.
Infelizmente, uma grande barreira para a exploração desses jogos é a língua, uma vez que eles estão em japonês e a maioria nunca recebeu tradução de fãs. Bem, se serve de incentivo, tirando aluns poucos jogos da franquia com elementos de RPG e fortemente baseados em texto, grande parte é composta de jogos de plataforma em 2D simples de serem entendidos mesmo sem a compreensão do texto original (e Google Lens está aí, né?) O último jogo da série foi lançado em 2003 apenas para aparelhos celulares e, desde então, nunca mais se ouviu nada da franquia.
Bem, acredito que não seja novidade para ninguém que a Konami não aguentou as mudanças nos modelos de desenvolvimento de jogos trazidas pela 7ª geração de consoles (Xbox 360, PlayStation 3 e Wii) e diversificou suas fontes de lucro passando a dar cada vez menos importância ao mercado de videogames nos anos que se seguiram.
Grandes franquias como Castlevania, Contra e Metal Gear tiveram um fim lento e agonizante com suas principais mentes criativas se espalhando pelo mundo e muitas vezes voltando ao cenário através de jogos independentes: foi o que aconteceu com o Koji Igarashi de Castlevania (que retornou com o Bloodstained), o Hideo Kojima (que retornou com o Death Stranding) mas ninguém mais tinha tido notícias do nobre Etsunobu Ebisu… até agora.
Como fã da franquia, foi uma imensa felicidade saber que Ebisu estava participando do desenvolvimento de um novo jogo. E imagine o tamanho da felicidade quando soube que, embora todo o histórico da série Ganbare Goemon, Bakeru iria sim ser localizado oficialmente para o ocidente!
Este é o perfeito sucessor espiritual! Está tudo aqui: as músicas, o folclore, as referências à cultura pop e, acima de tudo, uma exploração quase que turística da ilha japonesa. Um prato cheio para qualquer jovem dos anos 90 cujo coração carrega algum amor pela cultura nipônica.
Bakeru, which is a spiritual successor to the Ganbare Goemon / The Legend of the Mystical Ninja series, brings back the 1990s/2000s in an excellent package of 3D action and platforming gameplay, where the combat is thrilling, the exploration is rewarding, and the visuals, story, and soundtrack are captivating. The experience is enjoyable for the whole family and highlights the best and main feature of video games: fun.
[Nota do Editor: Bakeru foi analisado a partir da sua versão para Nintendo Switch. A cópia do jogo foi gentilmente cedida pela Spike Chunsoft para avaliação.]
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