Jogos são obras de arte? Por muito tempo, acreditei que não. Na verdade, minha resposta para essa questão ainda pende à negativa, porém, o cenário independente de videogames pelo menos contesta meu posicionamento. Por que jogos não seriam obras de arte? Ora, porque fazem parte de uma indústria, e a finalidade principal dos produtos dessa indústria é o lucro. Videogame é um mercado de produtos facilmente reprodutíveis que vende entretenimento, e a arte vai muita além disso, a arte é, principalmente, espaço e fruto de uma carga subjetiva que eu não acredito – ou não acreditava – existir na indústria dos videogames. Nesse sentido, Takeshi and Hiroshi, o último jogo independente que joguei por enquanto, me ensinou algo.
Desenvolvido pela Oink Games, Takeshi and Hiroshi foi anunciado e lançado para o Nintendo Switch na Indie World do dia 18 de agosto de 2020. Na história, você interpreta Takeshi, aspirante a designer de jogos e irmão mais velho de Hiroshi, que, sem me aprofundar muito na proposta do game, tem como objetivo desenvolver um RPG, chamado Mighty Warrior, para entreter o caçula. É um jogo sobre um jogo, poético por ser metalinguagem.
Takeshi and Hiroshi foi um dos jogos indies que menos me chamaram atenção quando anunciado para o Switch, em agosto. A princípio, não pensei que o gasto valeria a pena, uma vez que a gameplay é relativamente simples e, devido à desvalorização do real, chega a custar cinquenta reais. No entanto, é exatamente a simplicidade de Takeshi and Hiroshi que me encanta. É uma simplicidade profunda, porém cotidiana, que me coloca à identificação. A história é envolvente, não me permitiu interrompê-la até terminá-la. É ingênua, talvez infantil, quase romântica, emocionante… tudo isso sem abrir mão da simplicidade. Eu finalmente pude jogar Takeshi and Hiroshi, e finalmente experimentei algo totalmente inédito: a sensação de me apaixonar pelo “simples”, em um jogo de cerca de uma hora de duração.
Jogos de curta duração – salvas raras exceções, como A Short Hike – nunca me chamaram muita atenção. Não porque os conhecia o suficiente pra saber que não me interessam, mas porque não esperava que pudessem me entreter, justamente por conta de sua limitação de tempo. Eu não sabia que era possível desenvolver, não como emTakeshi and Hiroshi, uma história comovente em apenas uma hora.
Durante os sete capítulos do jogo novos personagens são apresentados, como Erika, amiga de infância de Takeshi, e Yosuke, novato no colégio. O desenvolvimento de cada uma dessas relações nos demonstram outros lados de Takeshi, que manifesta sentimentos familiares: o orgulho, o encanto, a preocupação. Takeshi, sem contar pela sua capacidade de desenhar e programar um jogo aos 14 anos de idade, é uma pessoa comum, familiar.
Acredito que o visual é sempre o primeiro recurso a falar sobre qualquer jogo. Em Takeshi and Hiroshi não é diferente. Os gráficos e as animações, feitos à mão por meio de stop motion, são a ilustração perfeita para a história que os desenvolvedores pretendem contar. Os menus, que lembram minhas páginas de cadernos na quinta série do ensino fundamental, remetem a todos os demais aspectos do game. A forma como são apresentadas as caixas de diálogo, assim como a trilha sonora, me lembram que o jogo se trata de um pequeno RPG independente, vezes medieval, vezes contemporâneo.
Talvez, a impressão que fica é que o ‘jogo sobre jogo’ esteja mais próximo de uma experiência cinematográfica, já que a gameplay é, para mim, pouco relevante à história quando comparada às cutscenes. No geral, as fases de Mighty Warrior não são desafiadoras, mesmo levando em consideração as implicações, além da vitória dos turnos, necessárias para concluí-las. Estas, talvez, pareçam estar ali puramente como um complemento à cinemática, mas elas não poderiam não estar.
Acontece que Takeshi and Hiroshi precisa de Mighty Warrior… não porque é um jogo sobre um jogo ou apenas um complemento para cinemática, mas porque Mighty Warrior é sobre Takeshi, sobre as relações que o protagonista desenvolve durante os capítulos, assim como, acredito, Takeshi and Hiroshi fale sobre seus desenvolvedores, da mesma forma que qualquer jogo fala sobre quem o desenvolve. Um jogo sobre jogos… Takeshi and Hiroshi me fez perceber que mesmo em uma indústria, como a dos videogames, a subjetividade e a arte se fazem presentes.
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