Abaixo, a Pirataria!

Abaixo, a Pirataria!

Os famosos piratas foram “criminosos” financiados por grandes nações que atacavam e saqueavam navios portugueses e espanhóis em busca de riquezas, e o lucro, como se convencionou pensar, não ficava com eles, afinal eram financiados pelas coroas excluídas do Tratado de Tordesilhas sendo obrigados a entregar suas pilhagens aos seus financiadores. Quando um novo tratado foi assinado em 1713 esse “apoio” bélico e financeiro acabou, forçando os Corsários ( os países patrocinadores davam a Carta de Corso aos capitães que permitia as pilhagens e ataques na época ) já acostumados à vida no mar a continuar pilhando cidades e embarcações para sobreviver. Alguns ficaram famosos, poucos ficaram vivos e que se saiba só um se aposentou com sua fortuna.

Considere a vida desses homens que abandonavam suas terras natais com a promessa de aventura e riqueza para viver meses sem água, comida ou tratamento médico tendo que viver numa mini sociedade onde as tarefas e espólios eram divididos de forma igual assim como as decisões também eram. Um juiz era eleito para resolver conflitos e suas decisões eram aceitas por todos. Conhecendo novas terras, novas culturas e levando itens e especiarias para países pobres que não pertenciam as rotas oficiais, transportando passageiros mais pobres, encomendas mais baratas e muitas vezes ilícitas. Sendo julgados e enforcados em praça pública pelos mesmos países que lhes tratavam como heróis. Considere.

Considere como muitos faziam o que amavam, seja pela emoção ou vocação, sem imaginar o valor moral embutido nessas ações e escolhas, se eram certas ou erradas, se prejudicavam ou não cada nação dona dos navios pilhados ou destruídos. Era apenas uma forma de viver que beneficiou tanto os ricos quanto os pobres. Considere agora dois jovens numa garagem tentando ganhar dinheiro aproveitando um mercado que ainda não existia, por ser ignorado pelas grandes corporações, com foco no lucro usando a ideia de popularizar o acesso do consumidor comum aos computadores, dois visionários que visavam o lucro e se auto intitulavam “piratas” que seriam pilhados por outro “pirata”. Hoje todos famosos e bilionários.

“Piratas” modernos que acabaram se tornando aquilo que juravam combater, vendendo caro produtos que prometeram popularizar e atacando pequenas embarcações para pilhar ou destruir as que não conseguem comprar para suas frotas. Grandes corporações mais poderosas e ricas que muitos países do mundo controlando leis e politicas internacionais para perpetuar seu lucro, tecendo acordos que remetem ao feito em 1713. Qualquer um que não singrar usando a bandeira certa será abatido ou adquirido. Piratas vendiam seus serviços a quem pagasse mais, porém nunca vendiam seus navios. Roubavam grandes e suntuosas embarcações para gastar essas moedas em pequenos países pobres, com comida, bebida, suprimentos e suas necessidades de momento fazendo a economia local girar dentro do possível. Enriqueciam junto a sua tripulação dividindo igualmente os espólios e não ficando acima deles ostentando suas fortunas. Serão esses “piratas” realmente piratas?

Uma empresa multibilionária como a Nintendo não mede esforços para afundar sites que contém “Roms (cópias digitais retiradas de jogos físicos) de seus jogos antigos. Sites que levaram anos garimpando e preservando jogos famosos e pouco conhecidos, populares e raros que poderiam ser jogados por um grande público, pois não foram vendidos no mundo todo estariam acessíveis nos computadores, celulares e até outros consoles da mesma empresa. Jogos que foram eternizados e amados por diferentes gerações, fornecidos de forma “gratuita” na internet, não só aumentando a base de fãs, mas também mantendo fieis aqueles fãs antigos que não tinham mais seus consoles de infância. Pirataria. Distribuindo algo que até pouco tempo não tinha valor pra empresa. E quando a empresa percebeu o valor dessas iguarias afundou os piratas. 1713, de novo.

A Nintendo não é a única fazer isso, como também não foi a única grande empresa a se beneficiar da massificação de um produto vendido no mercado paralelo ou se aproveitar de um sucesso da concorrência para criar a sua própria versão ( vide o Color TV-Game 6 ). Nada mais justo que a empresa queira ter controle de suas propriedades e ser responsável pelo fornecimento de um produto com o seu selo de qualidade. Justo. Ter seus ganhos assegurados para pagar suas contas e funcionários em dia e com dignidade. Justo. Só não espere que eu a defenda quando ela vai atrás do site que tem o meu amado Akumajō Special: Boku Dracula-kun e muitas outras iguarias impossíveis de se achar de forma física ou oficial, porém deixando vazar lançamentos do Switch com vários dias de antecedência. Justo? Outro fato pouco conhecido sobre a época dos corsários é que a bandeira mais perigosa era a vermelha e não a preta como se acostumou pensar. Irônico não?

O termo “pirata” perdeu a sua essência quando o último corsário abaixou sua bandeira e aceitou a vida na terra firme, tanto de forma virtual quanto nos mares os “pseudopiratas” não compartilham de seus ideais ou códigos de honra. Hoje os auto denominados piratas modernos tornaram-se grandes impérios e delegaram às pequenas embarcações a alcunha de criminosos por facilitar o acesso aos seus caros produtos, que muitos não podem adquirir, cultivando uma idolatria na qual os moradores do vilarejo preferem pagar mais caro execrando os piratas e seus consumidores. Enxergam a pirataria como uma traição contra a empresa e seus consumidores. Será?

Será que não existem formas de oferecer esses jogos antigos de forma oficial, fidelizando o consumidor? Formas de dificultar os vazamentos ou “destravamentos” dos consoles? Oferecer as bibliotecas dos consoles antigos por um valor simbólico e acessível? De graça? Consoles mais baratos? Jogos mais baratos? Será tudo isso não é exatamente pra que os piratas existam, alcançando novos vilarejos, mostrando as iguarias e formando possíveis consumidores fiéis aos impérios (empresas) fornecedores?

Afinal, caro leitor, os piratas ganharam a fama, mas quem ficou mais rico foram os países que os perseguiam.

Considere.

Bom final de semana, fiquem bem.


[A coluna acima reflete a opinião do redator e não do portal Project N]

Nerd, nostálgico, pai e professor. Reclamador profissional com PHD em Harvard. Conheço o Mario, e daí? Assopra a fita e bora jogar! Canal Juninhos Fun Club no Youtube!!!